É óbvio dizer, mas meu ganha-pão me confere algumas regalias: uma das que mais gosto é a possibilidade de testar, com certa antecedência, a esmagadora maioria dos jogos que todo mundo quer (ou não quer…), e também aqueles que poucos ouviram falar. Independente de qual título seja, tento ser o mais justo possível em uma análise, sem mentir nem omitir nada – se é ruim, educadamente aponto os defeitos e o que poderia ter sido feito para que eles não acontecessem (ao invés de escrachar e chutar o pau da barraca como muitos por aí). Se for bom, direi o motivo dele ser bom, se poderia ser melhor ou não, e darei os merecidos parabéns.
A coisa que mais odeio em um review é ver o quanto a minha indústria, o jornalismo de games, peca muito na parte do “jornalismo”. E não falo das publicações brasileiras: acredito com fervor que somos exemplos de imparcialidade e justiça. Falo de reviews como aqueles feitos por portais como IGN, Gamespot e afins (que me desculpem os puristas, mas sempre defendi que os bois recebessem os devidos nomes). A razão de mencionar especificamente esses sites não é infundada: quando comecei, minhas análises sempre tinham fundamentos referenciados neles – coisa de jornalista: veja o que outros dizem sobre o produto que você está, e fundamente sua opinião argumentado ou contra-argumentando os…argumentos…de outros, formando a sua própria opinião.
Depois de uns bons meses, a frequência com que passei a utilizar referências desses sites diminuiu drasticamente, chegando ao ponto de eu apenas olhar a nota que eles aplicaram e ler alguma coisa apenas quando consta uma seção “O Bom / O Ruim”: digo isso porque os padrões de análise deles vêm dando “privilégios” a jogos que possuem enorme hype, ao passo que outros títulos de menor publicidade sempre, sempre recebem notas desfavoráveis (o que nem sempre é sinônimo de ruim). Exemplo: Watchmen: The End Is Nigh é, a grosso modo, um Streets of Rage em versão HD, com os personagens e a história inspirados pela obra de Alan Moore. O IGN deu 5,5: concordo com o fato do jogo ser óbvio demais, e na maioria dos níveis, fácil demais. Mas 5,5? Eu fui incumbido de fazer a análise desse mesmo jogo para a EGM Brasil e para o MSN Jogos: não vou dizer minha nota, mas garanto que foi mais que 5,5. Por que? Porque The End Is Nigh merece! Os gráficos estão ótimos, a trilha sonora está ótima, a jogabilidade está ótima, e o enredo oferece um pouco de interesse no restante da obra. Infelizmente, o MSN não me permite um sistema de notas tão aberto, então fui obrigado a botar na balança, e sim, ele perdeu mais pontos do que deveria. Se quiser, pode conferir a análise clicando aqui.
Outro exemplo: Lucas Patrício me disse que o IGN deu 8,0 para Star Ocean: The Last Hope. Não joguei, então não comentarei a nota. O que me deixou coçando a testa foram os pontos negativos enunciados pelo site – o fato dele ter apenas 20 save slots (normalmente, eu nunca uso mais de um – três, quando o jogo pede um planejamento maior…será que eles nunca ouviram falar em “OVERWRITE”?), além dele ser um “J-RPG¹ muito clássico, por ter dungeons muito grandes e seguir elementos característicos desse gênero, como um personagem ficar verde sob o status de ‘envenenado’ ou um relógio representar visualmente a magia Slow“. Recado àqueles carentes de inovação: ISSO TEM QUE ESTAR PRESENTE EM QUALQUER RPG!!! Acha que faltou ação em Star Ocean? Volte um geração e jogue God of War no seu PlayStation 2. Um RPG que se preze tem que ter longas horas de partida, muitas coisas opcionais para se fazer, tesouros a serem encontrados dentro do próprio mapa, com exploração em tempo real. Faz parte do gênero, e estraga se faltar alguma dessas coisas…
O que estou tentando dizer é que a falta de análise consciente não é problema tupiniquim: como disse, acredito que somos proeminência nesse quesito (menos a VEJA!). Os gringos, penso eu, fazem análises ridículas, e pior, vendidas. Para conhecimento: Kane & Lynch é um jogo fraquinho, um título de ação genérico, que sofre com a falta de elementos inovadores, que realmente apareçam na tela e possa chocar o usuário. Jeff Gerstmann, um dos editores do Gamespot, foi demitido por falar a verdade do jogo da Eidos, a mesma empresa que produz a sensacional, porém atualmente decadente, franquia Tomb Raider – o review controverso pode ser lido aqui. Outro caso interessante: Dan “Shoe” Hsu, ex-editor da EGM norte-americana, publicou um editorial em alguma edição da revista, que foi re-publicado em algum link que não ainda achei, mas que mostrava a declaração de uma produtora não-nomeada, dizendo que “sim, nós conseguimos tirar um 10 quase sempre. Basta fecharmos um pacote de publicidade com eles e nossos jogos ganham propaganda favorável sempre que necessário”.
Falar mal faz parte, e defendo a liberdade de opinião, e a produção de um texto livre de qualquer influência ou capitania de grandes produtoras: não gosto, não faço, não quero. Desaprovo isso tanto quanto a pirataria. Mas a ética pede que façamos isso com educação: funciona tão bem quanto vender jabá.
Muita gente me perguntou se favoreci Taikodom pelo fato dele ser brasileiro e tudo o mais, e a resposta é não: acho Taikodom um jogo bom, nada mais, nada menos. É bom. Pronto, fim de papo. Por isso que dei 7,0 quando analisei-o na edição 83 da EGM Brasil. Se fosse melhor, daria mais, claro, mas para um jogo que ficou quase 7 anos em desenvovimento, o visual tinha que ser top do top, coisa que ficou faltando e tirou pontos. A Hoplon fez um jogo bom, e nada mais. Como disse na chamada do review: “Não é World of Warcraft“, mas também, quem é que esperava isso de Taikodom?
Que se dane a pressão de produtoras, que se dane a publicidade da sua editora e seus “business”: uma revista, ou site, que seja, só vai adquirir credibilidade e ser levado a sério se tiver opinião forte, mas justa. Todos os portais que citei aqui possuem muita, mas muita grana, e as campanhas de publicidade mais legais que eu já vi em toda a internet são feitas lá – sobretudo IGN e seus banners 3D interativos, mas não adianta ter bala na agulha se você não sabe atirar: se ninguém confia nas suas palavras, de que vale seu trabalho?
¹: J-RPG é o RPG natural do Japão